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| em 2 semanas ago

Carros elétricos têm maior risco de incêndio que os modelos a combustão?

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Estatísticas revelam que esse tipo de ocorrência é bem menos comum em veículos elétricos; especialistas apontam pontos críticos e possíveis soluções

Por Alexandre Carneiro

Frequentemente apontados como futuro inexorável da indústria automobilística, mas ainda recentes nas ruas do Brasil, os carros elétricos despertam algumas dúvidas nos consumidores. Uma das mais sérias diz respeito a incêndios: afinal, esses veículos são mais suscetíveis às chamas que os modelos tradicionais, a combustão? A resposta, felizmente, é não; muito pelo contrário.

Na verdade, carros elétricos têm chances muito mais reduzidas de pegarem fogo: a taxa de incêndio nesses modelos é cerca de 60 vezes menor do que em veículos a combustão. É o que explica Erbis Biscarri, perito judicial e instrutor, com foco em cursos sobre  prevenção e análise de incêndios em automóveis e máquinas agrícolas, que ministra cursos na Sociedade de Engenheiros da Mobilidade do Brasil (SAE Brasil). 

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O especialista cita um levantamento do site AutoinsuranceEZ, que compila dados de seguradoras sediadas nos Estados Unidos. De acordo com a pesquisa, a cada 100 mil carros elétricos, apenas 25,1 pegaram fogo em 2021. Já entre os modelos a combustão, ocorreram 1.529,9 incêndios para cada grupo de 100 mil veículos.

Há, porém, um outro problema: embora, estatisticamente, os carros elétricos se envolvam muito menos em incêndios que os similares à combustão, uma vez que as chamas surgem é bem mais difícil extingui-las. Isso se deve à composição química das baterias, que utilizam um eletrólito (líquido que envolve as placas positiva e negativa) à base de lítio. Rafael Castro, engenheiro de telecomunicações especializado em segurança e sistemas de detecção e alarme de incêndios, explica: “quando esse componente pega fogo, libera oxigênio, que, por sua vez, alimenta as próprias chamas”.  Biscarri acrescenta que as baterias de íons de lítio têm outras substâncias químicas oxidantes, como Flúor e Fósforo. Ademais, há alguns materiais combustíveis, incluindo solventes, separador plástico e lítio na forma metálica. 

Desse modo, enquanto os bombeiros geralmente conseguem apagar um incêndio em um veículo a combustão em poucos minutos, a extinção das chamas em carros elétricos costuma levar horas e demandar quantidade muito maior de água. Consequentemente, já existem métodos específicos para combate a chamas em baterias de lítio, entre os quais extintores da classe D.

Incêndios em carros elétricos: raros, mas destrutivos

O caso é que, ainda que sejam muitíssimo mais raros, incêndios em carros elétricos têm enorme potencial destrutivo. Castro pondera que a situação mais preocupante é quando há vários veículos elétricos estacionados muito próximos, o que pode fazer com que as chamas se alastrem e tomem grandes proporções. 

Biscarri alerta que essa espécie de efeito-dominó é apontada como causa de dois grandes incêndios em navios de transporte de veículos: no Felicity Ace, em fevereiro de 2022, e no Fremantle Highway, em julho de 2023. Ele também lembra de ocorrências do gênero em estacionamentos. Por isso, o perito acredita que algumas medidas preventivas devem ser tomadas: “a presença de sprinklers (esguichos de água acionados automaticamente por um detector de fumaça) em estações de recarga e em garagens é plenamente justificável, assim como um afastamento mínimo de outros veículos ou o uso de paredes corta-fogo no entorno de vagas de carros elétricos”, sugere.

Vale lembrar que, no último mês de abril, o Corpo de Bombeiros de São Paulo lançou uma consulta pública com o objetivo de criar uma regulamentação para pontos de recarga de carros elétricos. Entre as medidas propostas pela corporação, estão justamente a presença de paredes corta-fogo ou um afastamento de cinco metros entre as vagas, além da instalação de sprinklers em garagens cobertas. Outras proposições são chaves para desligar os carregadores a uma distância de 20 a 40 metros e a instalação de extintores e de placas de alerta de perigo.

O que pode ocasionar incêndios em carros elétricos?

Um dos riscos apontados por Castro decorre de grandes variações de temperaturas: essas situações, em tese, podem gerar incêndios. Além do mais, em qualquer tipo de bateria, podem ocorrer curto-circuitos nos polos. Biscarri esclarece que o projeto desses componentes inclui salvaguardas, justamente para evitar que problemas catastróficos ocorram durante o uso. “No entanto, ainda existe uma taxa de falhas, que, embora pequena, não é nula”, observa o especialista. 

Castro destaca que instalações de recarga malfeitas ou irregulares constituem uma séria ameaça. Ele recorda que, no exterior, já ocorreram incêndios em carros elétricos devido a improvisações no ponto de conexão com a rede elétrica. Biscarri também vê riscos nesse tipo de situação e esclarece que é muito importante utilizar sempre carregadores homologados pelo fabricante do veículo. Mas ele pondera que esses equipamentos têm salvaguardas, e que a tecnologia de proteção segue evoluindo.

Risco de explosão

Cabe destacar ainda que, quando pegam fogo, as baterias dos carros elétricos correm risco, igualmente muito baixo, de explosão. Isso porque as chamas geram gases: consequentemente, o invólucro desses componentes acaba não suportando a pressão. Porém, ainda que as baterias de íons de lítio geralmente fiquem posicionadas embaixo dos ocupantes, na parte inferior do entre-eixos do veículo, Biscarri tranquiliza os motoristas sobre esse tipo de ocorrência. “O assoalho normalmente protege os ocupantes adequadamente”, explica.

O perito adverte que a situação potencialmente mais perigosa ocorre quando os gases e vapores combustíveis de uma bateria que esteja sofrendo uma falha denominada “avalanche térmica” ficam aprisionados no interior da cabine ou de uma garagem. Se houver um curto-circuito, a consequência pode ser uma explosão. Contudo, novamente, trata-se de uma ocorrência muito rara.

Constante evolução

A boa notícia é que, se atualmente incêndios em carros elétricos já são raros, com o tempo esse tipo de ocorrência deve se tornar ainda mais incomum. Biscarri opina que, à medida que esses veículos ganham relevância no mercado global, vão ocorrendo evoluções nas baterias. Como exemplo, ele cita o uso de grafeno nos eletrodos e de outras substâncias no eletrólito e no espaçador, que já está sendo estudado em pesquisas. Tal solução promete tanto melhorar o desempenho do componente quanto reduzir o risco de fogo. 

Foto principal | BYD/Divulgação

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Redação

Redator do Autos Segredos.